16 de agosto de 2022

Classificação do café no Brasil explicada: análise sensorial e de qualidade de bebida

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A prova da bebida, ou a “prova da xícara”, que analisa a qualidade do perfil sensorial, de aroma e sabor dos grãos de café commodity, é feita após a classificação física. A metodologia de avaliação e termos classificatórios são ditados pela normativa oficial COB, sigla da tabela oficial da Classificação Oficial Brasileira de Café, que foi estabelecida pelo Ministério de Agricultura e Pecuária (MAPA).

Neste artigo o PDG Brasil vai explorar a análise organoléptica, ou sensorial, quanto à qualidade da bebida por meio da classificação chamada “prova da xícara” no dia a dia dos escritórios comerciais.

Saiba mais sobre os defeitos do café e como reduzi-los para obter mais qualidade no artigo do PDG Brasil sobre como evitar defeitos.

análise de café

A classificação dos cafés no Brasil

Todos os lotes de grãos de café produzidos e comercializados no Brasil são submetidos a análises classificatórias quanto à escala de qualidade do grão e do perfil de bebida, para que seja possível a precificação necessária a transações em âmbito nacional e internacional.

As regras e instruções de categorização de todos os processos de análises físicas e organolépticas indicadas pela COB avaliam características do café verde, o grão cru, por meio das análises por tipo, cor (classe), umidade e granulometria (peneiras).

A variação de classificação mais associada ao café brasileiro é a por tipo, que se dá pela contagem de defeitos de lotes de 300 g de amostra de café verde, cuja pontuação se alinha aos graus da escala de qualidade por tipo na tabela da COB. A avaliação granulométrica define o tamanho dos grãos através de um jogo de peneiras. As avaliações por cor (classe) e umidade discriminam a idade, condições de armazenamento e possíveis doenças do cafeeiro absorvidas pelos grãos. 

Importante ressaltar que os classificadores mencionados na normativa COB avaliam grãos de café comercializados como commodity, enquanto os Q-Graders (ou avaliadores de qualidade, em tradução livre) são credenciados e formados em degustação de cafés especiais, por meio dos quesitos ditados pelo instituto internacional de qualidade do café (Coffee Quality Institute – CQI) em parceria com a SCA (Associação de Cafés Especiais, instituição referência em cafés de qualidade de abrangência mundial).

A escala da SCA não contempla valores inferiores a 80 pontos da avaliação por tipo quanto à contagem de defeitos, e avalia a qualidade dos cafés por meio de critérios específicos para esse tipo de transação (vendas diretas e fora dos sistemas de compra e venda e precificação do café commodity). A descrição dos aromas e sabores dos cafés especiais é baseada na roda de sabores da associação internacional. 

classificação de cafés no Brasil

A “prova da xícara”

Em 1917, com a instalação da Bolsa Oficial de Café e Mercadoria de Santos, surgiu no Brasil a “prova da xícara”, então empregada de forma não oficial para julgar o aroma e sabor da bebida. Em 14 de setembro de 1949, através do Decreto n. 27.173, o governo promulgou novas especificações para a classificação do café, como a avaliação da qualidade por meio tanto das características físicas quanto sensoriais. A “prova da xícara” passou a ser um processo oficial e hoje é uma etapa fundamental para classificar a qualidade final tanto do grão quanto da bebida derivada. 

Considerada pelo ramo da corretagem como o fator mais importante para a classificação, a “prova da xícara” é o que de fato determina a precificação do café a ser comercializado. Os lotes analisados de forma organoléptica (sensorial) também formam a base de dados necessária para que as torrefações (clientes) definam o conteúdo dos lotes vendidos como blends (mistura de lotes).

A qualidade da bebida do café é classificada de acordo com uma série de critérios, e isso se dá pois a correlação com a análise física dos grãos verdes não se traduz necessariamente em qualidade quanto às características de gosto e aroma da bebida gerada.

classificação de café

As regras de classificação da qualidade da bebida

Os grãos selecionados para a torra e prova degustativa são classificados por análises físicas (intrínsecas, às inerentes do grão, e extrínsecas, as impurezas externas) imediatamente antes do processo da “prova da xícara”.

A torra para a prova da xícara deve ser clara, para que se possa identificar defeitos na bebida, e o nível de moagem grosso. A cada torra de amostras, deve ser feita uma torra de limpeza, para se certificar de que não há contaminação de grãos diferentes. 

Os escritórios de comércio exterior utilizam torradores específicos para as amostras, que contêm menor capacidade de grãos e uma série de tambores que funcionam ao mesmo tempo. A instrução da COB também dita quais os procedimentos de limpeza e cuidados gerais que devem ser seguidos durante todo o processo de classificação.

avaliação de cafés

As etapas da análise organoléptica

Quando chega à mesa específica para a “prova da xícara”, cada copo de teste leva 10 gramas de café e 100 ml de água (mole, ou filtrada e sem resíduos excedentes de minérios como calcário), cuja temperatura ideal é de 90ºC. 

A mistura permanece em infusão por 4 minutos, quando a crosta formada é “quebrada” com uma colher específica para a prova para que se avalie os aromas da mistura. Os resíduos são misturados levemente com o líquido antes da prova degustativa. A bebida não é ingerida pelo classificador, que a cospe em um copo de descarte.

análise sensorial de café

O profissional então avalia as características qualitativas da bebida de acordo com o corpo, aroma e sabor, e cruza as informações considerando a designação física da amostra, que deve especificar a data do processamento e local de origem do cultivo e tipo de fermentação. 

De acordo com a normativa da COB, é mediante a “prova de xícara” que se determina o grupo e subgrupo dos cafés beneficiados “grão cru”. 

Há uma escala de classificação diferente quanto à qualidade da bebida dos grupos robusta e arábica. 

Bebidas do grupo robusta

  • Excelente: café que apresenta sabor neutro e acidez mediana; 
  • Boa: café que apresenta sabor neutro e ligeira acidez; 
  • Regular: café que apresenta sabor típico de robusta, sem acidez;
  • Anormal: café que apresenta sabor não característico ao produto.  

As designadas “bebidas finas” do grupo arábica são as consideradas de qualidade superior de acordo com a COB. Já as “fenicadas” do grupo arábica são as bebidas de qualidade inferior, que apresentam aroma e sabor desagradáveis. 

Bebidas finas do grupo arábica

  • Estritamente mole: todos os requisitos de aroma e sabor “mole”; 
  • Mole: aroma e sabor agradável, brando e adocicado; 
  • Apenas mole: sabor levemente doce e suave, sem adstringência ou aspereza de paladar; 
  • Duro: café que apresenta sabor acre, adstringente e áspero, porém não apresenta paladares estranhos. 

Bebidas fenicadas do grupo arábica

  • Riado: café que apresenta leve sabor típico de iodofórmio; 
  • Rio: café que apresenta sabor típico e acentuado de iodofórmio; 
  • Rio Zona: aroma e sabor muito acentuado assemelhado ao iodofórmio ou ao ácido fênico, sendo repugnante ao paladar. 

Como características adicionais da amostra no laudo de qualidade nos moldes da COB, a critério do comprador, podem ser solicitados: a análise do grau de cafeína, tipo de processo (via seca, úmida), qualidade da seca (processos de via seca), qualidade da torração e aparência dos grãos. 

prova de xícaras café

A classificação de qualidade da bebida na prática

Na época da publicação da COB, em 2013, era prática que os classificadores de café tirassem uma certificação oficial, com cursos autorizados pelo MAPA, mas, na prática e no dia a dia dos escritórios de corretagem, esse treinamento é feito internamente. 

Clique aqui para entender melhor os pormenores da seleção realizada costumeiramente no meio de comércio exterior de café.

“O treinamento da função da maioria dos classificadores (antigos e contemporâneos) é desenvolvido internamente, tanto na prática quanto em desenvolvimento da aptidão, apesar de existirem cursos introdutórios disponíveis quanto aos critérios COB. Já os Q-Graders devem atualizar seus certificados de três em três anos”, explica Edgar André Gomes, diretor de controle de qualidade da empresa de comércio exterior de café Wolthers & Associates, baseada em Santos (SP).

Uma das razões para o enfoque na formação interna é que há diferenças objetivas entre os critérios normalmente solicitados por clientes, tanto nacionais quanto internacionais, diz Edgar. “Os critérios de classificação e da política interna de certificação de qualidade solicitada são abrangentes e subjetivos”, diz Edgar. 

prova de xícaras café

Características de avaliação na prática 

Segundo Edgar, as análises realizadas nos escritórios podem seguir tanto as regras da COB, ou das tabelas de análise de qualidade da Bolsa de Café de Nova Iorque (NYBOT), que controla os preços do comércio internacional quanto a contratos de compra e venda de café arábica, e da Bolsa de Café de Londres, que centraliza as operações de café robusta (canéforas), ou ambas. 

“O mesmo lote pode passar por critérios diferentes de classificação por tipo, bebida e peneira entre diferentes clientes (internacionais), com valor de aceitação mínima de defeitos (segundo as bolsas) diferentes.”

Além de tocar os processos de qualificação dos lotes negociados pela Wolthers, tanto de commodity quanto em negociações diretas (cafés especiais), Edgar é responsável pelo departamento de Quality Control, um serviço de classificação e qualificação prestado pelas corretoras como parte terceirizada. 

“O cliente pode ser tanto o vendedor quanto o comprador do café, nós apenas fazemos a análise de aprovação de que o lote corresponde aos valores de qualidade esperados. A amostra de aprovação chega no mínimo de um mês antes do embarque, e quando certificada, aguarda-se o aviso de embarque para checarmos. Caso haja rejeição do cliente quanto às qualificações da avaliação ou demandas específicas de padrão que devem ser alteradas, o processo é reiniciado.”

As normativas de classificação e determinações quanto à designação de qualidade do Brasil seguem em evolução, como o mercado do café global em geral, que demanda transparência quanto ao ciclo produtivo e aos atributos dos grãos. 

Prova disso é que em maio de 2022, o MAPA aprovou uma nova determinação quanto ao padrão de classificação do café torrado, em parceria com a ABIC. Entre outras mudanças, a nova normativa torna obrigatório a partir de janeiro de 2023 que as embalagens dos cafés comercializados no Brasil contenham as informações do tipo de grão e o grau da torra nas embalagens. 

prova de xícaras de café

Critérios internos à parte, quanto maior o número de informações dos cafés, quem ganha é o produtor, que tem seu trabalho valorizado, e o consumidor, que dispõe de ferramentas para escolhas de compra. 

Créditos: Embrapa Café (mesa de classificação de qualidade da bebida); Divulgação Wolthers (mesa de contagem de defeitos, mesa de prova da xícara, degustador Edgar e amostras); Victor de Paula Souza (degustador de óculos, Anderson Nunes; provador com o avental).   

PDG Brasil

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