1 de maio de 2023

O que é erva-mate?

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Em todo o mundo, muitas pessoas bebem café por seu teor de cafeína – um estimulante natural que pode melhorar uma série de funções cognitivas. Além do café, essa substância também é encontrada em outros produtos, como chá, cacau, guaraná e erva-mate.

Consumida há séculos em alguns países da América do Sul, a erva-mate (Ilex paraguariensis) é um vegetal que pertence ao gênero llex. Uma vez secos, seus caules e folhas podem ser mergulhados em água quente para produzir uma bebida terrosa e ligeiramente amarga, semelhante a um chá.

Atualmente, as bebidas à base de erva-mate podem ser encontradas em todo o mundo, incluindo as opções de bebidas prontas para consumo (RTD), cada vez mais populares nos EUA e na Europa. Segundo a BevNet, o mercado de erva-mate RTD foi avaliado em US$ 93,2 milhões em 2016 e é provável que esse número tenha crescido desde então.

Para saber mais sobre a erva-mate, como ela é tradicionalmente preparada e consumida e seu crescente mercado de RTD, conversei com três especialistas da indústria. Continue lendo para saber mais sobre eles.

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Erva-mate preparada da forma tradicional

Uma breve história

Acredita-se que a planta Ilex paraguariensis tenha sido descoberta por indígenas guaranis que viviam no que hoje é conhecido como Paraguai. Durante séculos, ela foi consumida por tribos indígenas por razões culturais e espirituais, bem como por seus supostos efeitos medicinais.

O povo Guarani inicialmente mastigava as folhas e caules da planta, mas depois começou a mergulhá-la em água para criar uma bebida semelhante ao chá. Isso era feito em panelas de barro ou em cabaças ocas e secas. E a bebida era consumida usando varas ocas como uma espécie de canudo.

No entanto, quando os colonos europeus chegaram ao Paraguai em  meados do século XVI , o consumo de  erva-mate foi inicialmente proibido. As potências coloniais europeias consideraram a planta viciante à época.

Nos anos que se seguiram, no entanto, os colonos europeus reverteram a proibição e forçaram os povos nativos escravizados a aumentar a produção da erva. A primeira rota  comercial para a erva-mate foi estabelecida em 1645, permitindo que folhas e caules secos fossem exportados para países europeus.

Com o aumento do consumo de erva-mate – tanto no país quanto no exterior – tornou-se uma das maiores culturas de renda da colônia. No entanto, esse crescimento veio às custas da exploração dos povos indígenas. A produção então começou a aumentar constantemente em países vizinhos, como Argentina e Brasil.

No final dos anos 1700, colonos europeus foram expulsos do Paraguai, o que significou que muitas plantações de erva-mate foram abandonadas e, por sua vez, a produção começou a diminuir.  Após uma guerra devastadora ocorrida de 1864 a 1870, a Argentina e o Brasil anexaram algumas das terras paraguaias, que incluíam grandes regiões de cultivo. Isso significou que a produção no país chegou ao fim, enquanto na Argentina e no Brasil ela cresceu e ambos países passaram a exportar mais.

Pessoa com uma caneca de erva-mate nas mãos

A importância cultural da erva-mate

A Erva-mate tem profundas histórias enraizadas em várias culturas diferentes na América do Sul. De acordo com a Statista, a Argentina produziu mais de 837.200 toneladas em 2019. Além disso, o Instituto Nacional de Erva-mate afirma que 100 litros da bebida são consumidos a cada ano per capita. O Brasil, hoje, é o maior produtor mundial de mate com base em estatísticas da FAO-ONU.

De acordo com Callum Berry, proprietário da importadora britânica Anam Mate, beber erva-mate é culturalmente significativo em alguns países da América do Sul. “Lá as pessoas cresceram bebendo e ainda bebem hoje – é parte de sua tradição e herança”, diz.

Durante séculos, a bebida foi preparada e consumida em comunidade. Seguindo a colonização do povo nativo paraguaio, os gaúchos (que são considerados caubóis sul-americanos) preservaram a tradição de compartilhar erva-mate entre amigos e familiares.

Andrés Puras Fernández é chileno e dirige um canal do YouTube sobre erva-mate. Ele conta que a bebida ainda é consumida por meios tradicionais em toda a América do Sul. “Em supermercados e casas na Argentina, Brasil e Uruguai, você verá muitos produtos de erva-mate. E encontrará pessoas bebendo em muitos lugares”, diz.

Cada vez mais conhecida fora de seu berço

No entanto, tanto Andrés quanto Callum mencionam que a bebida não é tão popular em outras partes do mundo, mas dizem que a demanda parece ter aumentado nos últimos anos.

Na verdade, a erva-mate também é comumente consumida no Líbano, na Síria e em outras partes do Oriente Médio (principalmente pelo povo druso e alauita). Mas isso está em grande parte ligado à migração histórica da América do Sul.

Andrés menciona especificamente que seu canal no YouTube viu um aumento significativo no tráfego durante a pandemia. E que, além disso, a popularidade da erva-mate entre os jogadores profissionais de futebol do Reino Unido pode ser atribuída ao aumento da demanda geral.

“Não vai agradar a todos porque algumas pessoas podem querer uma bebida mais rápida e conveniente”, diz ele. “Mas a maneira tradicional de consumir erva-mate se alinha com meus próprios valores pessoais. É algo para desacelerar e tirar um tempo do meu dia para aproveitar.”  Essa ideia é um pouco semelhante à filosofia  Slow Food, que abraça a ideia de reservar um tempo para desfrutar de alimentos e bebidas – incluindo o café e a erva-mate.

Uma bomba, espécie de canudo usado tradicionalmente para consumir o mate

Como se prepara o mate?

Tradicionalmente, as folhas de erva-mate secas são colocadas em uma cabaça. Em seguida, você adiciona água quente (mas não fervente). Aí então deixa que as folhas fiquem imersas por alguns minutos.

Uma vez preparado, o erva-mate é geralmente consumido através de uma bomba, que é um canudo de metal contendo um filtro embutido. A cabaça pode então ser recarregada com água quantas vezes forem necessárias ou até que as folhas tenham perdido a maior parte de seu sabor.

Callum me diz que enquanto alguns consumidores hoje optam por vasos de vidro ou aço, muitos ainda preferem cabaças artesanais e bombas feitas de materiais naturais. Estes podem incluir certos tipos de madeiras, como Palo Santo, ou podem até ser feitos de cabaças ocas, curadas e secas.

Muitas pessoas acreditam que beber erva-mate de uma cabaça tradicional confere mais sabor à bebida e melhora a experiência geral.

“Em comparação com beber de uma caneca, usar uma cabaça tradicional tem muito mais significado cultural”, explica Callum. “Você tem que cuidar da sua cabaça, então a conexão que você tem com ela é única.”

Os rituais associados e alternativas de consumo

Andrés diz que há uma cultura de entusiastas da erva-mate. “Há as pessoas que realmente gostam da bebida. E às vezes elas fazem suas próprias cabaças, bombas e outros acessórios, devido a cultura ser interessante para elas”, diz.

Victoria de la Torre é a fundadora da SouthmaTea, um fornecedor de erva-mate com sede em Buenos Aires, Argentina. Ela me diz que as crianças bebem mate nas escolas da Argentina, muitas vezes adicionando leite e açúcar para “torná-lo mais agradável” para paladares menos desenvolvidos.

Andrés diz que o clima pode influenciar como as pessoas preparam o erva-mate. Por exemplo, em países que experimentam períodos mais longos de clima quente, muitas pessoas optam por preparar a bebida usando água fria – o que, sem dúvida, afeta o tempo total de preparação e a extração de sabores.

Descrevendo os sabores da erva-mate

“Amargo” é muitas vezes uma palavra usada para descrever a erva-mate, mas Victoria diz que seus sabores podem variar de acordo com fatores como origem e métodos de secagem.

“Semelhante ao café e ao vinho, os sabores podem variar dependendo do terroir onde foi cultivado. Algumas origens podem ter um sabor mais terroso, enquanto outras podem ter um sabor mais complexo, picante e agridoce”, ela explica.

Victoria acrescenta ainda que o mate argentino é geralmente cultivado em solo rico em minerais na floresta tropical do país, e que as folhas são secas sobre o fogo, o que pode trazer notas defumadas à bebida. Andrés concorda, dizendo que uma vez que você se familiariza com os sabores do mate, é provável que você saiba onde ele foi cultivado. Isso se assemelha com os cafés de origem única. Ele diz ainda que a erva-mate argentina é mais doce, indicada para quem bebe pela primeira vez. 

Benefícios e riscos para a saúde

Em todo o mundo, muitas pessoas bebem erva-mate por seus supostos benefícios à saúde. Pesquisas descobriram que o consumo de mate está associado à perda de peso e à proteção do sistema  imunológico. Além disso, a erva contém antioxidantes como saponinas e polifenóis. Essas substâncias têm propriedades anti-inflamatórias e redutoras do colesterol.

No entanto, esses benefícios para a saúde variam conforme a quantidade de erva-mate que você consome e como você bebe, além de como as folhas são secas e processadas.

Segundo Callum, existem muitas variedades de mate e o sabor e a composição química de cada uma delas é diferente. “Como ela pode ser consumido por longos períodos, não resulta em uma injeção muito alta de cafeína”, diz.

“A erva-mate pode ser comparado ao café em termos de teor de cafeína”, explica Victoria. “Ele pode ser consumido ao longo do dia e pode ajudar a mantê-lo alerta e energizado.”

Normalmente, uma porção de 150 ml de erva-mate contém cerca de 80 mg de cafeína, mas diferentes variedades podem ter quantidades variáveis de cafeína. No entanto, adicionar continuamente mais água à bebida significa que a ingestão de cafeína pode aumentar significativamente.

Além disso, os caules e as folhas são frequentemente secos sobre o fogo, e algumas fontes sugerem que isso pode formar hidrocarbonetos aromáticos policíclicos. Estes são conhecidos por serem cancerígenos, mas mais pesquisas clínicas são necessárias para verificar cientificamente quaisquer supostos riscos e benefícios para a saúde da erva-mate.

Lata de bebida gelada e pronta para o consumo à base de mate.

Bebidas prontas para o consumo à base de erva-mate

Andrés diz que, embora os métodos de consumo mais tradicionais possam não atrair a maioria das pessoas, a crescente diversificação dos produtos de erva-mate e dos métodos de preparação está ajudando a tornar a bebida mais popular. 

“Nos EUA, algumas pessoas a preparam em uma prensa francesa”, diz ele, que acrescenta: “As bebidas energéticas RTD (prontas para o consumo) à base de erva-mate também estão se tornando mais populares. Pode-se incluir frutas para criar diferentes sabores.” 

Atualmente, existem vários produtos de mate enlatados RTD, em especial nos EUA e na Europa. Uma marca proeminente é a Guayakí, criada na Califórnia em 1996. Além de vender folhas soltas de erva-mate, a empresa também vende bebidas em latas e gaseificadas.

Em 2021, a subsidiária da Coca-Cola, Honest Tea, lançou uma bebida de erva mate RTD, que incluía várias opções diferentes de sabor.

Mais inovações e potencial de mercado

Callum também observa a variedade de sacos de mate de dose única adoçados agora disponíveis no mercado para aqueles que procuram métodos de preparação mais convenientes.

Em relação ao seu potencial de mercado, Andrés diz que a erva-mate é tipicamente mais barata do que o café, o que poderia ajudar a torná-la mais popular. No entanto, ele ressalta que, devido ao pequeno número de países produtores de mate, é improvável que a produção possa escalar significativamente. Callum considera que é necessário estabelecer uma distinção entre as opções tradicionais de erva-mate e as opções de RTD, em grande parte porque oferecem experiências diferentes aos consumidores.

Uma cuia de mate

A rica história da erva-mate, sem dúvida, a torna uma bebida culturalmente significativa para muitas pessoas na América do Sul. Para os bebedores mais tradicionais, o ritual de preparar e compartilhar mate com amigos e familiares é de vital importância.

No entanto, com o crescente número de produtos mate disponíveis em todo o mundo, é claro que as formas mais modernas de consumir a bebida também estão se tornando cada vez mais populares.

“Mais pessoas deveriam experimentar”, conclui Andrés. “É uma bebida interessante com muita herança tradicional, mas não é valorizada o suficiente.”

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PDG Brasil

Traduzido por Daniela Melfi

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